segunda-feira, 9 de julho de 2012

Despedida, não adeus

fotografia de Machiel Botman
Despeço-me aqui de todos que acompanham este blog desde sua criação, em 2007, com espírito de gratidão e missão cumprida.
Esse blog surgiu do livro em co-autoria com a Perita Digital Arlete Muoio, Crimes na Rede - O Perigo que se Esconde no Computador, publicado no mesmo ano. Foi uma tentativa de aproximar este trabalho de meu pensamento e texto, tão distanciada este estava de minhas próprias questões. Porém, trabalho necessário, visto o abuso da impunidade no meio virtual por pessoas mal intencionadas e criminosas. Quando Arlete me convidou para auxilia-la no livro, depois de quase quatro anos pesquisando e entrevistando pessoas envolvidas nos crimes virtuais, vítimas e criminosos, após sofrer todo tipo de ameaça, eu não poderia declinar o convite. De tudo o que pesquisei e vi durante esse período em que trabalhamos juntas, o que mais me chocou foi o abuso de crianças. Recentemente li uma reportagem sobre uma quadrilha de pedofilia na Internet, que foi desmantelada pela Polícia. Creio que o livro Crimes na Rede teve sua contribuição, assim como essa profissional que dedicou anos de sua vida à denúncia de crimes virtuais, com foco na pedofilia. Coincidentemente, atravessamos ambas uma crise existencial profissional. Buscamos definições pessoais e direções de carreira. De minha parte, decidi encerrar este blog. Sigo um outro percurso.
Há cerca de um ano, um editor demonstrou interesse em editar os textos publicados aqui que versavam sobre diversos temas humanos. Retirados os textos do blog, revisados e reescritos, ele desistiu por motivos financeiros. 
Hoje, o pêndulo do meu desejo oscila entre a arte e a escrita, que sempre se convergem. Talvez em algum momento ele vá em direção a revisão e tentativa de publicação deste pequeno livro chamado Consciência na Rede - Reflexões sobre a Vida Contemporânea. Talvez não.
Hoje sei que consciência está muito mais na não-dualidade e não-julgamento, e refletida no desprendimento e desapego. É consequência de olhar para dentro de si com compaixão, em olhar para o outro com amor, em aceitar as pessoas e os eventos como se apresentam a nós. Consciência é presença. E resgata um certo estado de inocência. É o que desejo, enquanto percurso pessoal e artístico.
Desapego-me e me desprendo deste que foi o lugar das idiossincrasias compartilhadas, da troca de ideias,  do encontro e reencontro. Dos assuntos densos, leves, polêmicos, divertidos.
Despeço-me, não sem pesar, buscando outro lar para as ideias. Nestes anos, eu mudei, você mudou. Tudo é diferente agora. Mas haveremos de nos encontrar algumas vezes nesta rede de fios invisíveis, na expansão da minha, da sua, da nossa consciência.
Deixo um presente: uma pequena parte de minha verdade, compartilhada com você. Você pode aceita-lo ou não.

Nos vemos em:  www.maluaguiar.com.br

sábado, 16 de junho de 2012

Os deuses devem estar loucos

Xi na Janela dos Deuses

Esta foi, para mim, uma semana estranha. Você sabe aqueles momentos em que tudo parece tão equivocado que você tem a impressão de que está dentro de um filme ruim com um enredo confuso? Ou que tem a sensação de ter sido abduzido e levado a um planeta desconhecido, cuja língua e costumes dos habitantes são, para você, incompreensíveis? Creio que me senti como o personagem Xi, do filme The Gods Must be Crazy, de Jamie Uyis, quando encontra espécimes do dito "homem civilizado" pela primeira vez. Xi adapta-se. Mesmo quando percebe que esses seres dizem uma coisa quando querem dizer outra e agem em desacordo com o que sentem. 
Creio que isso é o que todos, ou a maioria de nós, fazemos constantemente: um exercício de adaptação aos afetos, desejos, ambições, hábitos, linguagem, atitudes, projeções e expressões do outro. Afinal, somos e soamos sempre como estranhos uns aos outros e, quando isso não acontece, quando sentimos que alguém realmente nos vê, ouve ou compreende, a vida torna-se uma grande festa. Mas essa sensação é efêmera, volátil e evanesce facilmente com a proximidade, com a intimidade, com os conflitos, com o tempo e com a morte.  Nestes momentos, sentimo-nos apartados e não-pertinentes. O amor se retira e dá espaço à solidão e ao vazio. Quedamos em nossas celas pessoais, como Xi - que desconhecia paredes - silencia quando é jogado em uma prisão durante três meses. Ele não conhece o conceito de tempo; não fosse resgatado, morreria. Xi encontra um tradutor que o entende e o resgata. Muitos de nós nem sempre tem a mesma sorte
Xi pertence a uma família de khoisan (bosquímanos) que vive no centro do deserto de Kalahari e que nunca tivera contato com a civilização. Vivem no Paraíso e são completamente inocentes: desconhecem a propriedade, a ambição, o conflito e a violência, bem como sentimentos como inveja, ciúme, raiva, medo ou voracidade. Certo dia, deparam com uma garrafa de coca-cola jogada de um avião e imaginam que se trata de um belo "presente dos deuses". Ela se torna extremamente útil nas atividades da família, devido a seu formato e a sua dureza e resistência. Porém, também não pode ser compartilhada, por ser uma só. Isso provoca tudo o que até então desconheciam: cobiça, inveja, raiva, voracidade, medo, conflito e por fim, violência. Pensam que os deuses deviam estar loucos para dar-lhes tal presente e passam a considerá-la "do mal". Xi tenta devolvê-la aos deuses, sem sucesso. Então decidem que ele deve partir em uma longa jornada rumo ao fim do mundo para deixá-la lá e retornar. Neste percurso, Xi encontra diversas pessoas "civilizadas" e se envolve com elas nas mais diversas situações "humanas". Xi sofre, Xi aprende, Xi se adapta. Mas não a ponto de perder sua natureza inocente, dócil, gentil, sua alegria ou apagar seu sorriso solar.
Em certos momentos gostaria de partir rumo ao fim do mundo com esta garrafa de coca-cola do mal presenteada por deuses loucos e atirá-la no abismo. E resgatar a inocência, a docilidade, a gentileza, a alegria e um sorriso solar. 

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Vida e arte na esfera pública e privada

Diane Arbus - Autorretrato
Lembro-me quando, há anos, fui à exposição de meu professor de Filosofia da Arte, RES e me surpreendi ao deparar - em uma de suas "cabanas" - com uma foto que eu tirara de uma jovem mulher de costas, durante uma festa de família, colada sobre a capa de um dos seus cadernos, sem referência a pessoa ou a autoria da imagem. Era uma foto bela e delicada, entre a pintura de Jon Muth e de Gerhard Richter, feita em baixíssima definição, o que me impediria de utiliza-la como obra, por isso nunca pedi a autorização da moça em questão para usa-la. E também por se tratar de um exercício de educação do olhar, como muitos outros que realizei durante minha formação como artista. Recordo-me que o evento me chateou até o momento em que considerei que eu mesma me apropriara de uma obra de RES: "Museu: Mundo de Coisas Vivas", com sua devida autorização e até mesmo incentivo (outro exercício que nunca chegou a ser exposto como obra). Posteriormente, utilizei-me de uma fotografia de Leonardo Kossoy, também colada sobre um caderno, no projeto Com.E.Nos (não autorizada, mas com a devida referência a autoria). Parte de minha pesquisa como artista, no começo de minha formação, foi a apropriação como linguagem. Pesquisa essa que migrou para a aproximação entre vida e arte, o que resultou na prática de autorretratos por quatro anos e depois para a produção de vídeos com a participação de amigos.  Possuo um espólio de vídeos que tenho postado no Youtube, com a devida autorização (verbal ou escrita) desses colaboradores, que possuem total controle sobre o uso de sua imagem por mim, o que significa que se não me autorizarem, não a utilizo. Uma das participantes do projeto não apreciou o recorte de nosso diálogo e, devido a isso, o vídeo nunca foi publicado. O que talvez ainda me incomode sobre essa imagem da jovem mulher é que ela, desafeita a exposições de arte, anos depois ainda não sabe que sua imagem foi utilizada por um artista em uma obra. Como os transeuntes do Centro, que aparecem nas fotografias tiradas da janela do ateliê de um amigo artista, não sabem que suas imagens são vinculadas na Internet. Ou os "estranhos" de Arbus não deviam ter consciência de que suas imagens tornariam-se históricas e que seriam reproduzidas infinitamente em livros de arte e fotografia. Digo o mesmo sobre os anônimos nas imagens de Cartier-Bresson ou Sebastião Salgado e muitos outros brilhantes artistas e fotógrafos. "A foto pode mostrar um rosto, um objeto, um acontecimento qualquer. Mas o que aparece é convocado, é citado a comparecer no dia do Juízo Final. A eterna repetição é aqui uma chave secreta da apokatastasis, da infinita recapitulação de uma existência. Mas o sujeito fotografado exige algo de nós: aquela pessoa, aquele rosto, exigem seu nome, exigem que não sejam esquecidos." (Giorgio Aganbem).
O escritor Grégorie Boiullier não teria como saber que sua carta de rompimento com a artista Sophie Calle seria exposta pelo mundo na exposição Cuide de Você. Todas as imagens da obra foram devidamente elaboradas e produzidas em co-parceria entre a artista e os participantes. Sophie com certeza sabe como transformar um evento pessoal em obra de arte, ressignificando sua própria experiência e transcendendo-a em plástica. E Grégorie soube contemporizar a auto exposição de sua intimidade. 
Mas "o que aparece"  o rosto deduas mulheres que passam de bicicleta na Escócia, a vitrina de uma loja em Paris é convocado, é citado para comparecer no Dia do Juízo
Nesta semana, fui surpreendida sendo involuntariamente catapultada para dentro de um projeto artístico de um casal de jovens artistas, através do Facebook, por tê-los adicionados a meu perfil por termos amigos em comum. Não citarei seus nomes e tampouco do projeto, para preservar suas identidades e não comprometer a efetividade do mesmo. E, embora tenha sido co-autora do livro Crimes na Rede, sou usuária contumaz das redes sociais e, principalmente, do Facebook, onde dialogo com amigos  próximos ou distantes, compartilho ideias e projetos profissionais. Há muito não pensava sobre essa questão da privacidade, embora seja bastante importante para mim preserva-la. Em outras palavras, tendo a confiar nas pessoas e sou aberta. Não é incomum que pessoas que conheci virtualmente confiem em mim a ponto de expor ideias, idiossincrasias, projetos de vida... Em nenhum momento, quando interajo com elas, sendo  artista e escritora, penso em utilizar suas identidades como base para minha obra literária ou visual. Uma referência ou outra pode acontecer, mas o meu esforço de preservar sua privacidade é tão grande que muitas vezes sacrifico  uma possibilidade criativa nisso. Haja visto um projeto com uma dileta amiga de que nossos diálogos virtuais se transformem numa obra literária cujo nome seria Cartas ao Feminino, esteja parado. O esforço de preservar a identidade e privacidade de pessoas que citamos nas cartas é tal, como separar pequenos diamantes na miríade do deserto, que sabemos que nos consumirá muito tempo sobre algo que praticamente nasceu pronto. 
Esse projeto artístico virtual que cito, muito bem elaborado e cuja escrita foi muito bem estruturada, tem uma base teórica e um estofo filosófico bastante interessantes. E em momento algum eu questiono a sua validade como arte. O que me incomoda é a falácia da abordagem. Até o presente momento, ao interagir com os personagens, ainda não sei onde termina a realidade e começa a ficção. E sei que, mesmo não tendo autorizado em momento algum minha participação no projeto ou a publicação de minhas declarações no mesmo, corro o risco de que isso aconteça. O mesmo risco de ter minha imagem captada por um atirador de elite no telhado e infinitamente reproduzida na rede. 

domingo, 8 de abril de 2012

A mulher é o negro do mundo

Cena de Rapture, de Shirin Neshat
Meu manifesto particular:
Sou mulher e não gosto de roupas justas
Sou mulher e não gosto de saltos altos
Sou mulher e não gosto de expor meu umbigo 
Sou mulher e só uso blusas decotadas porque golas mais altas me sufocam
E embora tenha me rendido aos encantos das maquiagens e cosméticos, sou mulher e não me arrumo para os outros (ou outras mulheres)
Sou mulher e, embora quando vá comprar underwears básicas quase sempre não resista a rendas e fricotes, não desejo seduzir com roupas justas, maquiagem, saltos altos, rendas e fricotes
Sou mulher e aprecio sexo; sou mulher e sei separar sexo de outras coisas e não o uso como moeda de troca; sou mulher e reajo a estímulos visuais
Sou mulher e não gosto de ser objetualizada, dirigida e cerceada; não sou frágil e não preciso de proteção
Sou mulher e acredito nos homens e não os generalizo, porque os vejo como eu, com um ser humano em desenvolvimento e talvez um pouco confusos e perdidos em papéis sociais

Sim, com um mês de atraso do propagado (ridículo) Dia da Mulher, venho colocar uma opinião: que todos somos iguais perante a natureza, Universo e quiça exista um(a) Deus-a sem gênero, hermafrodita e andrógino, somos iguais perante ele/ela também, independente de gênero.
Um vídeo no Youtube causou debates sobre brinquedos dirigidos às meninas e aos meninos. E, ontem, lendo uma revista no salão de beleza que frequento semanalmente - dessas dirigidas ao "público feminino", repleta de imagens de uma beleza feminina plastificada e inatingível, com direito à muita maquiagem de estúdio, iluminação e photoshop, recheada de assuntos de "interesses femininos" como dicas de uma astróloga para conquistar os homens de cada signo, como secar a gordura abdominal e decoração de casamento - li uma interessante reportagem sobre o tema. Nela, especialistas afirmam que essa distinção na infância vai determinar os papéis sociais da idade adulta. Que existem atividades  ainda hoje consideradas típicas da mulher, como cuidar da casa e dos filhos, talvez em decorrência da menina brincar de bonecas e casinha, enquanto o menino é estimulado a praticar esportes e molecagens. E que ainda existem profissões consideradas "femininas", que envolvem cuidar do outro, como educação infantil e enfermagem, assim como profissões consideradas "masculinas", como engenharia e neurociência. Neste caso, as mulheres continuam ingressando no mercado de trabalho em sujeição aos cargos masculinos e com salários menores. Pode? Parece que sim.... 
Sim, a mulher é o negro do mundo. Quarenta anos depois que Jonh Lennon declarou isso em uma música, muito pouca coisa mudou, concordo  com Edson Moreira. Talvez haja um pouco mais mudanças em estratos sócio-econômicos e culturais mais altos. Mas questões como a opressão, abuso emocional e mesmo a violência contra a mulher, não são prerrogativa das camadas mais baixas da população. E, muitas vezes, é tão sutil e subcutânea que quase não notamos. Pode vir mascarada de um cuidado excessivo, de um ciúme silencioso, de dependência ou indiferença. Pode vir na forma de brincadeiras entre amigos que colocam a mulher no patamar de uma boneca inflável: usa, usa e quando "estourar", joga fora. 
"Sim, a mulher é o negro do mundo. Se você não acredita, dê uma olhada em quem está contigo. A mulher é o escravo dos escravos." 
O que as mulheres conquistaram com a revolução sexual da década de 70, com a propagada "libertação feminina"? Talvez acumular papéis sociais, como ter dupla ou tripla jornada de trabalho, como ser arrimo de família, como manter financeira e emocionalmente homens perdidos em seus próprios papéis sociais, como gerar meninos e meninas com eternos meninos e ter de cuidar deles sozinhas depois, como ouvir frases como "não quis igualdade de direitos? do que está reclamando agora"? e como permanecer sendo objetualizada, agredida, violentada, ter sua liberdade cerceada e sua sexualidade questionada; e ter de recorrer a subterfúgios para parecer uma "boa moça", ainda agora, no século XXI. E, em algumas sociedades, ainda ser coberta, circuncisada, infibulada, apedrejada à morte o que, por muitos, é considerada uma simples "questão cultural".  
Sim, a mulher continua a ser objetualizada em nossa sociedade moderna ocidental, basta ver as capas de revistas nas bancas de jornais, assistir aos programas de auditório, acompanhar as últimas matérias sobre rape dates (estupro em encontro) ou as polêmicas sobre o comprimento da saia de uma moça num ambiente estudantil (que posteriormente venha a se tornar mais um objeto de consumo de revistas e outros itens) e ainda, os vídeo-clips das musas da cultura pop, mulheres talentosíssimas e com belas vozes mas que essencialmente vendem CD´s por suas imagens-padrão. 
Sim, a mulher é o negro do mundo. Se você não acredita, mulher, dê uma olhada em quem está contigo.

ative a legenda apertando CC

sexta-feira, 30 de março de 2012

Mamute - Um Gigante Confinado

obra de Bansky

Dois filmes, um mesmo animal: elefante. Mammoth (Corações em Conflito), Water for Elephants (Água para Elefantes). Animal imenso, forte, capaz de matar um homem com uma pisada. De natureza dócil, domesticável, é capaz de ser detido com uma única vareta presa ao chão e a uma de suas patas, basta condicioná-lo desde pequeno. 
O primeiro filme mostra o confinamento social em que vivemos, o condicionamento que nos leva a repetidos gabaritos, sejam em condições sócio-econômicas muito favoráveis ou absolutamente precárias. 
O segundo, quase uma fábula, revela o aspecto sombrio de um universo de aparência libertária: quem algum dia sonhou em abandonar seu mundo comum e fugir com o circo descobre que até mesmo este símbolo último de liberdade pode se transformar em outra espécie de escravidão, mesmo que voluntária.
Os dois filmes colocam o trabalho como o elemento central que governa nossas vidas. É em torno dele e na órbita do dinheiro que ele proporciona que o mundo gira; nestas horas em que trabalhamos e não vivemos, sejamos ricos ou pobres, porque todos precisamos sobreviver. Da bolsa de valores ou do lixo.
Estamos presos nas nossas rotas de consumo, mesmo que isso dependa do sacrifício de milhões. Como ratos na gaiola, já não sabemos se fazemos a roda girar ou se é ela que nos controla e movimenta. Não sabemos se escolhemos os caminhos ou se são os caminhos que nos escolhem. Vivemos confinados em nossos corpos, desejos e ambições e em nossas próprias biografias e frustrações, interpretando os velhos papéis que nos são designados, numa economia de ações e num repertório limitado de gestos. 
Ambos os filmes tem como pano de fundo o casamento, que muitos ainda consideram uma prisão, cadafalso para o qual continuam caminhando casais dispostos a "se enforcar" juntos. Há tantos que fogem do compromisso quantos são os que o desejam. Nos dois filmes, há uma traição. Quem trai e quem é traído? 
O olhar perdido em perplexa constatação de sua própria impotência e o sentimento de inutilidade diante de um mundo complexo às raias da crueldade e injustiça, que Gael Garcia Bernal e Michelle Williams conferem aos seus personagens em Mammoth, revela nossa condição demasiado humana. Nossa condição de imensos mamutes confinados, atados pelo pé em pequenas varetas presas ao chão. Condicionados, confinados e traídos por nós mesmos em nossa imensa dimensão de mamutes. 

"Cada pequena escolha pode ter um impacto distante no mundo." 


"O mundo é movido por truques. E todos fingem."


sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Já viu? Onde estarão os Nobres?

Fiz uma pausa de cerca de quarenta minutos nas minhas atividades para me inteirar dos acontecimentos  mais recentes, já que estou mergulhada em trabalho nos últimos dias. Deparei com as absurdas imagens da reintegração de posse do bairro de Pinheirinho, em São José dos Campos. Entre emocionada e revoltada, me senti impelida a compartilhar, chamar a atenção e alertar para uma questão que já postei aqui antes: continuamos vivendo numa ditadura militar. Não vou entrar no mérito da questão politica ou dos interesses escusos e negociatas por trás dos eventos em que as Forças Armadas estão a serviço do poder e não do povo. As imagens falam por si mesmas: há sim, verdadeiros campos de concentração no Brasil, mas desta feita não é o povo judeu quem está segregado. No nosso país, para habitá-los, basta ser pobre. As câmaras de gás foram substituídas pelo gás pimenta e bombas de gás lacrimogêneo, os cidadãos não são colocados contra o paredão e sim caçados como animais e alvejados a esmo com balas de borracha ou não - incluindo idosos e crianças - quer seja nos quilombos ou nos terrenos abandonados ocupados. Já imagino a cena de Isabela Nobre, criança inocente brincando de casinha e panelinha, sendo abordada por um truculento policial militar sem identificação, com um fuzil apontado para sua cara: "Moço, o que foi que eu fiz?" e ele respondendo com um sorriso sardônico, antes de atirar "Você nasceu.".
Podemos fechar os olhos, mas o fogo não deixará de arder. Nosso mundo está em chamas e está faltando água... Porém, ao contrário de outrora, hoje temos VOZ: para tanto serve essa rede. Que nossos antecessores não tenham sido torturados e mortos por nada. Justiça seja feita. 

Um dia antes do massacre:


A verdade nua e crua:


Cerco aos quilombolas: